A
encenação do Bumba-meu-boi tem como base uma lenda que se passa em uma
fazenda às margens do rio São Francisco. Ela retrata a configuração
social do período da escravatura, mostrando o tipo de relação de poder
entre escravos e senhores e as crenças religiosas da época.
Segundo
a história, em uma grande fazenda de criação de gados, um casal de
escravos, Catirina e Francisco (também conhecidos como Mãe Catirina e
Pai Francisco, em algumas regiões) passam por uma situação inusitada.
Catirina está grávida e, certo dia, conta ao marido que está morrendo de
desejo de comer língua de boi. O marido, sabendo que desejo de mulher
grávida é uma ordem, busca uma solução. Francisco fica angustiado. Com
tantos bois perto, nenhum pertencia a eles, são todos do patrão.
Catirina
então, admirando a lua pela janela, avistou um boi bonito, gordo e
vistoso e pensou no quanto desejava comer língua de boi. Seu olhar
comprido comoveu o marido, que pegou o boi, o matou e cozinhou sua
língua, saciando o desejo da esposa.
O restante do boi, Francisco repartiu com os vizinhos, sobrando apenas o par de chifres e o rabo, que ninguém quis.
Os
dias passaram e, numa tarde qualquer, o amo começou a andar por sua
propriedade para conferir o rebanho. Foi então que ele sentiu falta de
seu grande boi que havia mandado trazer do Egito e perguntou a um de
seus empregados onde estava ele. O escravo, então, disse que seu boi
havia sumido. Um outro escravo que passava por ali, revoltado por não
ter ganhado nenhuma peça de carne, deu com a língua nos dentes e contou
que Francisco havia matado seu gado.
Inconsolado,
o amo caiu no choro. Francisco e Catirina, com medo da reação do
patrão, fugiram para uma outra cidade. O amo não queria nem saber, só
queria seu boi vivo de volta. Chamou rezadeiras, pagaram penitências,
curandeiros também foram anunciados para tentar ressuscitar o boi, mas o
rabo, os chifres e o esqueleto permaneciam no mesmo lugar.
A
história do senhor que chorava por seu boi assassinado se alastrou pela
região, chegando até a cidade para onde fugiram Catirina e Francisco. O
casal, então, confessou que estava morrendo de arrependimento pelo
crime cometido. O filho do casal, já grandinho, ouviu a história e pediu
aos pais que o levassem até a fazenda.
Chegaram
então os três na propriedade. Mesmo com medo de receber algum tipo de
castigo, o casal acompanhou o filho, que pegou o rabo do boi, espiou lá
dentro e deu três sopros muito fortes. O boi, então, viveu e saiu
chifrando quem tivesse pela frente. O amo não se aguentava de tanta
alegria. Abraçava todos e até perdoou Catirina e Francisco.
Essa é uma das versões da lenda, que ganha contornos diferentes em cada região do país.